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A acústica dos restaurantes realmente importa?

Atualizado: 20 de mai. de 2020

Ir em restaurantes e bares é um elemento muito importante na cultura brasileira. É inegável que gostamos de sair, nos divertir e ter uma boa conversa com nossos amigos. O problema é que boa parte desta atividade é normalmente interrompida pela falta de um elemento na grande maioria dos bares e restaurantes: o condicionamento acústico.


Em um bar ou em um restaurante nós presenciamos tipicamente três paisagens sonoras: a poluição sonora causada pelas pessoas e pelos carros na rua, a conversa das pessoas potencializadas pela reverberação do ambiente e o sistema de som [1]. Estes três elementos juntos podem estar em harmonia com o ambiente ou não. O segundo caso é o mais comum fazendo com que a inteligibilidade seja seriamente prejudicada pelo ruído de fundo do ambiente.


Quando falamos em inteligibilidade eu quero me referir ao simples ato de conseguir estabelecer uma conversa com as pessoas presentes na mesma mesa. Afinal de contas, nós saímos de casa e vamos até um restaurante por uma razão bem simples: queremos criar uma experiência de conexão com as pessoas que amamos. A inteligibilidade, por sua vez, depende da relação entre o nível de pressão sonora produzido pela nossa boca no ouvido de quem estamos tentando estabelecer uma conversa, que vamos chamar de receptor, e do nível de pressão do ruído de fundo produzido por todas as outras fontes presentes do local no ouvido deste mesmo receptor. Se o ruído de fundo torna-se muito alto, a nossa inteligibilidade fica prejudicada porque o ruído começa a se sobressair frente à mensagem que estamos tentando decifrar [2]. Em outras palavras, nós começamos a gritar.


Can you hear me?

Um efeito muito curioso da psicoacústica é o que chamamos de efeito Lombard. Este efeito é bem simples, imagine que você está acompanhado(a) em uma boate vazia que aos poucos começa a encher de gente. Quando a boate está vazia e a música está baixa, a conversa com seu acompanhante é relativamente fácil e o tom de voz permanece baixo. À medida que as pessoas começam a entrar e a boate começa a encher, mais pessoas começam a falar, a música torna-se mais alta e você começa gradativamente a aumentar o seu tom de voz. O problema é que todas as outras pessoas também estão tentando conversar e, por sua vez, também estão aumentando o seu tom de voz. O efeito Lombard é justamente essa resposta automática e inconsciente que nos faz aumentar o tom de voz à medida que o ruído de fundo do ambiente aumenta.

Photo by Sam Barber on Unsplash

Em restaurantes o efeito Lombard tem um efeito ainda mais drástico do que em boates. Quando grupos de pessoas começam a falar cada vez mais alto dentro de um restaurante, o ato de comer, beber e conversar começa a ser inviabilizado. Quantos restaurantes e bares você deixou de frequentar porque não consegue estabelecer uma conversa nestes ambientes? Quantos lugares você deixou de frequentar por se sentir desconfortável devido ao ruído de fundo elevado? Para muitos de vocês as experiências negativas foram inúmeras e muito provavelmente isso influencia negativamente no seu desejo de retornar ao local.


Preciso de um condicionamento acústico urgentemente?

O fato é que nem todos os restaurantes precisam necessariamente de uma intervenção na acústica do local. E sabe porque? Existem vários tipos de restaurantes e as experiências proporcionadas por cada um deles também é diferente. Um exemplo disso é a atenção que devemos dar ao conforto acústico em um fast-food, cujo intuito é fazer as pessoas permanecerem o menor espaço de tempo possível no local, e à uma churrascaria cujo público alvo são as classes A e B. Nós somos mais toleráveis em um ambiente cujo cardápio é, em sua grande maioria, de itens de baixo custo, mas nos tornamos cada vez mais exigentes à medida que o preço médio no cardápio torna-se maior [3]. Neste ponto entramos na questão da experiência, alguns estabelecimentos vendem experiência, outros vendem serviço de baixo custo. Nestes ambientes que vendem experiência, cada detalhe importa porque vamos percebê-los e possivelmente vamos criticar caso a experiência seja comprometida por algum elemento, como por exemplo o conforto acústico.


Um exemplo muito interessante que eu sempre gosto de mencionar é um estudo de caso publicado em 2019 na Inter-Noise [4]. Neste estudo de caso um restaurante em Madrid foi o objeto de estudo. Para nos contextualizarmos com o ambiente em que esse restaurante está conduzido, devo mencionar que Madrid é uma das cidades onde existe o maior número de bares por habitante. As pessoas costumam frequentar bares e restaurantes pelo menos 1,76 vezes por semana, em média. É um ambiente altamente concorrido e cada detalhe pode fazer uma diferença enorme no faturamento do local.


O ambiente citado no estudo feito por Juan Negreira já possuía um projeto de condicionamento acústico, estava dentro das normas vigentes na Espanha, mas mesmo assim os clientes reclamavam com relação ao barulho do local. Foi aí que o estudo entrou em ação. Foi conduzido um novo projeto de condicionamento acústico no local, as opiniões das pessoas antes e depois do projeto foram coletadas e os dados de faturamento também. O que se observou foi um acréscimo de 11% no faturamento do local, indicando possivelmente que parte daquelas pessoas que frequentavam o ambiente mas que não retornavam por terem se sentido desconfortáveis acabaram retornando após a reforma no ambiente. Com este acréscimo no faturamento provocado pela intervenção feita pelos autores do artigo, o projeto se pagou em um mês e meio. Um detalhe importante é que nenhum dos outros elementos como funcionários, iluminação, decoração ou cardápio foram alterados.


É neste cenário que eu posso afirmar com toda certeza que a acústica em um restaurante não é um elemento simplesmente opcional. É um detalhe no ambiente que pode fazer toda a diferença e que precisa, sem sombra de dúvidas, ser levado mais a sério. Um projeto acústico não só torna o ambiente mais confortável para você, para os seus funcionários e para os seus clientes como também traz retorno financeiro imediato. Consegui te convencer?


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Referências:

[1] Rohrmann, Bernd. "Soundscapes in restaurants." In World Forum Acoustic Ecology: Proceedings of the International Symposium of Acoustic Ecology. Melbourne, pp. 01-09. 2003.


[2] Long, Marshall. Architectural acoustics. Elsevier, 2005.


[3] Lindborg, PerMagnus. "Psychoacoustic, physical, and perceptual features of restaurants: A field survey in Singapore." Applied Acoustics 92 (2015): 47-60.


[4] Negreira, Juan, Carsten Svensson, Nigel Oseland, and Ricardo Canto-Leyton. "Good acoustics as an extra source of income in restaurants-A case study." In INTER-NOISE and NOISE-CON Congress and Conference Proceedings, vol. 259, no. 6, pp. 3096-3106. Institute of Noise Control Engineering, 2019.

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